O Ministério Público da Paraíba (MPPB) está questionando na Justiça a constitucionalidade de uma lei estadual (12.563/2023), editada pelo governador João Azevêdo (PSB), que regulamentou a contratação temporária para atender à necessidade de excepcional interesse público do governo.
A lei cria novas possibilidades de contratações temporárias em situações além do permitido na constituição e por um prazo de quatro anos, o que extrapolaria a razoabilidade da duração do contrato temporário. Dentre elas estão contratações para:
- promoção de campanhas de saúde pública;
- implantação e manutenção de serviços essenciais à população, especialmente à continuidade de obras e a prestação dos serviços de segurança, água, esgoto e energia;
- execução de serviços técnicos, fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras e serviços;
- suprimento de pessoal na área da educação, saúde, segurança e assistência social, nos casos de:
a) licença para repouso à gestante;
b) licença para tratamento de saúde;
c) licença por motivo de doença em pessoa da família;
d) licença para o trato de interesse particular;
e) exoneração;
f) demissão;
g) aposentadoria;
h) falecimento.
- realização de eventos patrocinados pelo Estado, tais como feiras, exposições, congressos e similares;
- atividades desenvolvidas no âmbito de projetos do sistema de inteligência da Secretária de Estado da Segurança e da Defesa Social.
O MP também questionou um trecho da lei que traz a expressão “mediante contrato administrativo padrão”, por entender que as contratações deveriam sempre ser feita por meio de processo seletivo.
A1ª subprocuradora-geral de Justiça, Vasti Cléa Marinho da Costa Lopes, pediu a suspensão imediata da lei.
Julgamento no TJPB
A Ação Direta de Inconstitucionalidade tramita no Tribunal de Justiça da Paraíba. O pedido está sob relatoria do desembargador Aluísio Bezerra Filho.
Em seu voto, o relator questiona as modalidades inseridas na lei, destacando posicionamento do Supremo Tribunal Federal de que as contratações temporárias devem se limitar a situações específicas, previstas em lei ordinária, por tempo determinado, necessidade temporária, interesse público excepcional e necessidade de contratação indispensável.
“A lei impugnada autoriza a contratação de servidores em casos desprovidos de excepcionalidade e que representam, na verdade, necessidade de contratação duradoura – e não passageira ou eventual -, subvertendo a regra do concurso público. Verifica-se que referidos incisos trazem situações corriqueiras no âmbito do serviço público, para as quais o Estado deve se programar para realizar concurso periodicamente”, pontua em seu voto.
Sobre o prazo de quatro ano das contratações, o desembargador disse que ele “extrapola os limites da razoabilidade, mostrando-se incompatível com a natureza da contratação temporária. Tal prazo deve ser balizado pelo tempo necessário para a realização de concurso público, conforme o Supremo Tribunal Federal já decidiu”, reforça.
Aluísio divergiu do MP em relação a possibilidade de contratação de contrato administrativo padrão.
Defesa do estado
O procurador-geral do Estado, Fábio Brito, durante o julgamento do caso negou as irregularidades apontadas pelo Ministério Público. O advogado disse que as hipóteses se balizam no entendimento do STF.
“Essas circunstâncias se encaixam perfeitamente na disposição do tema 612 da repercussão geral do Supremo Tribunal Federal, de modo que todas essas situações tratadas têm por objetivo a contratação em circunstâncias específicas, voltadas a evitar a descontinuidade de serviços públicos essenciais e especialmente em áreas sensíveis como são as da educação, saúde e segurança”, defendeu.
Fábio Brito também disse que a suspensão da norma pode causar reflexos negativos para o funcionamento da administração pública. “não tem como substituir imediatamente esses contratados por servidores efetivos, uma vez que a realização de concurso público e a nomeação de servidores, todos sabem, demanda tempo. Pode trazer colapso na prestação de serviços essenciais e também provocará uma desorganização administrativa impactando diretamente a população”, afirmou.
Crime de responsabilidade
Um dos questionamentos que ainda deve ser apreciado pelos desembargadores é se as irregularidades seriam passíveis de crime de responsabilidade criminal ao governador João Azevêdo.
No voto, Aluísio bezerra determina que o MP apure eventual cometimento de improbidade administrativa e responsabilidade criminal por prevaricação, despesa pública ilegal e outros crimes contra o erário.
Ao Conversa Política, a procuradora Vasti Clea, disse que aguarda o julgamento do TJPB para posicionamento.
O julgamento do caso está suspenso, após um pedido de vista da desembargadora Fátima Bezerra Cavalcanti. O TJPB só terá sessão ordinária no Plano na próxima semana.
TCE questiona excessos
O aumento do número de prestadores de serviço contratados no estado e nas prefeituras é alvo de preocupação do Tribunal de Contas do Estado da Paraíba. Em relatório recente, o órgão de controle avaliou que houve redução do número de servidores efetivos e aumento de contratados, ao analisar dados do SAGRES do mês de dezembro de 2022 a junho de 2024.
Em dezembro de 2022, segundo o TCE, os contratados representavam um percentual de 64,32% em relação ao quantitativo total de servidores efetivos. Eram 27.031 servidores contratados para 42.024 servidores efetivos na administração direta do Poder Executivo.
Em junho de 2024 o número total de contratados elevou-se para 30.593 e o quantitativo total de servidores efetivos elevou-se para 43.332, fazendo com que o número de contratados representasse um percentual de 70,60% dos servidores efetivos, o que não é razoável, tendo em vista a natureza das contratações.
“Tal fato contraria o art. 6º da RN-TC nº 04/2024 (com as alterações da RN-TC nº 05/2024), que estabelece o limite de 30% no quantitativo de prestadores de serviço em relação ao número de servidores efetivos”, destaca um relatório do TCE.