Mauá

STJ duvida de confissão gravada e absolve condenado por tráfico

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu ordem de habeas corpus para absolver um homem condenado por tráfico de drogas, por considerar ilícitas sua confissão informal e todas as provas dela derivadas, encontradas na casa de uma corré – a qual também foi beneficiada pela decisão do colegiado.

O indivíduo foi acusado de vender drogas juntamente com sua namorada, a qual seria responsável pela guarda dos entorpecentes. No dia do flagrante, ele foi abordado pelos policiais e, apesar de não ter sido encontrado nada ilícito em seu poder, teria confessado o local onde os entorpecentes estavam guardados.

 
 
   

A condenação em primeira instância considerou que as provas eram suficientes para demonstrar a autoria e a materialidade do crime, especialmente uma suposta confissão gravada em vídeo pelos policiais. Contrariando as alegações da defesa, o juízo entendeu que não houve violência policial nem irregularidades na entrada dos agentes na residência da corré. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a decisão.

No STJ, a defesa afirmou que a condenação foi baseada em provas ilícitas, obtidas a partir do ingresso ilegal dos policiais na casa da corré, e sustentou que, no momento da abordagem, não havia motivo algum para os agentes desconfiarem da atitude do acusado, o qual teria sido torturado para confessar.

Forma como a confissão foi gravada põe em dúvida sua veracidade

O relator do pedido de habeas corpus, ministro Rogerio Schietti Cruz, destacou o fato de que o juízo aceitou sem maiores questionamentos a versão de que o acusado, mesmo após uma revista pessoal na qual os policiais nada encontraram, teria informado a eles que havia drogas guardadas em outro local, agindo “como se estivesse entre amigos, confidenciando seus feitos”.

Schietti salientou que, segundo o relato constante no processo, a confissão foi prestada de forma calma e tranquila – nas palavras do juiz – e o indivíduo ainda teria levado os policiais até o local onde a droga estava armazenada “sem qualquer tipo de pressão ou constrangimento”.

Por outro lado, o relator observou que as imagens da confissão apresentadas pelos policiais mostram uma cena duvidosa, feita em lugar escuro, com o indivíduo sentado no chão e suas mãos escondidas debaixo das pernas.

“O fato de não se ter registrado uma explícita violência ou ameaça não é suficiente para afastar a alegação defensiva de que o paciente sofreu maus-tratos”, declarou o ministro, acrescentando que o laudo pericial mostrou uma lesão na mão do acusado.

Cabe ao Estado provar legalidade da atuação policial

Para Schietti, merece crédito o relato do paciente, que, desde a audiência de custódia, tem afirmado que foi vítima de violência policial. Nas declarações que ele prestou sem estar na presença de policiais – disse o ministro –, o acusado sempre afirmou ter sido torturado para confessar a guarda das drogas.

O relator ressaltou que cabe ao Estado provar que a atuação policial ocorreu dentro da legalidade, e não ao acusado demonstrar que sofreu violência. Conforme observou, os agentes não tiveram nenhuma preocupação em gravar a abordagem inicial nem a forma como ingressaram no domicílio, assim como foi feito com a confissão do acusado.

“A seletividade de se registrar apenas parte da atuação policial suscita dúvidas sobre a credibilidade do relato dos agentes estatais”, concluiu o ministro.